O romance fictício experimentado pelos humanos quando estabelecem relacionamentos sintéticos podem produzir emoções, citamos os mundos virtuais ou metaversos, jogo paintball, vídeo games, filmes ou romances, se relacionar com uma IA (filme Her, 2013) ou se relacionar com uma humanoide ou androide (filme Zoe, 2018), boneca holográfica Hatsune Miku (Gatebox, 2018), bonecos de pelúcia, bonecas reborn ou ter uma boneca do amor ou sexual.
Não é incomum ter relacionamentos com entidades não humanas. O Oxford English Dictionary (OED) define a palavra relacionamento como a maneira pela qual duas coisas estão conectadas. Enquanto a palavra sintético se refere a uma substância feita por síntese química imitando um produto natural, fibras ou tecidos sintéticos são feitos pelo homem a partir de materiais não naturais.
RELACIONAMENTO COM BONECAS SEXUAIS
Um artigo recente que procurou examinar se os relacionamentos com bonecas sexuais aumentam a tendência do dono de uma boneca de objetificar as mulheres não encontrou correlação entre a posse de bonecas e as atitudes objetificantes.
É possível fazer comparações entre esses dois tipos de relacionamentos inanimados ou sintéticos, mas uma distinção importante deve ser observada: bebês reborn não são eróticos, enquanto bonecas sexuais ou do amor são.
Bonecas do amor ou bonecas sexuais têm aproximadamente o tamanho humano e geralmente são feitas para se assemelhar a um ser humano convencionalmente atraente. Essas bonecas são usadas para atividades sexuais (masturbação). A maioria das bonecas do amor tem formato feminino, visto que a maioria dos compradores são homens heterossexuais. Em pesquisas mais recentes, os pedidos nas empresas de bonecas sexuais contam com solicitações de bonecas andrógenas e transexuais.
Em 2018, os pesquisadores Mitchell Langcaster-James e Gillian R. Bentley descobriram que os donos de bonecas sexuais relataram a companhia como um aspecto significativo de seu relacionamento.
Críticos das bonecas sexuais argumentam que sua própria existência contribui para a objetificação das mulheres. De fato, alguns entrevistados descreveram uma preferência por uma boneca em vez de um ser humano, já que não era necessário o consentimento da boneca para realizar qualquer tipo de prática ou fantasia sexual. Tais comentários incitam preocupações sobre como um usuário de boneca concebe um relacionamento consensual.
No Japão, há muitos consumidores de bonecas sintéticas, holográficas e locais destinados exclusivamente para encontros sexuais virtuais. As bonecas mais comuns são as Rabu Doru (bonecas do amor), que são bonecas sexuais feitas de silicone, vinil ou látex. Estas são frequentemente procuradas por homens que as veem como companheiras, e não apenas como objetos sexuais. Além disso, há as bonecas Hina Ningyō, usadas no festival da chegada da primavera e o crescimento das meninas. Estas bonecas são tradicionais e frequentemente feitas de madeira, porcelana ou pano. Outros tipos de bonecas populares incluem as Kokeshi, bonecas de madeira com características simplificadas e cores vibrantes. São bonecas usadas no festival Hina Matsuri, que celebra a chegada da primavera e o crescimento das meninas. Geralmente são apresentadas em uma prateleira de cinco níveis e representam a família imperial e os seus membros. Outros bonecos como Daruma, representa a força e persistência e Kintaro famoso boneco que representa bravura e força e celebração no dia dos meninos.
Os autores Jeanne C. Desbuleux e Johannes Fuss mencionam que as bonecas sexuais também podem proporcionar experiências de cura para algumas pessoas. Alguns indivíduos relatam um benefício de possuir uma boneca, com um aumento na saúde mental, uma redução do estresse percebido em situações sociais ou uma mudança positiva nas atitudes em relação às mulheres.
Precisamos de mais pesquisas nesta área para analisar a gama de atividades e relacionamentos que os donos de bonecas sexuais estão criando com seus companheiros sintéticos.
Além de uma identidade de cuidador, outro papel frequentemente explorado por meio de brincadeiras com uma boneca sexual em particular é o de parceiro romântico, marido ou namorado.
De acordo com uma pesquisa em 2018, realizada pelos antropólogos Mitchell Langcaster-James e Gillian R. Bentley, constataram que as motivações dos donos de bonecas sexuais incluem principalmente a necessidade de companheirismo e sexo. Este grupo de pessoas pesquisadas apresentaram também dificuldades com relacionamentos eróticos-afetivos reais, alguma fragilidade na saúde mental, experiências de rejeição, baixa autoestima e dificuldades com autoimagem. Apenas 14% dos entrevistados afirmaram que o sexo era exclusivamente o elemento central de seu relacionamento com bonecas sexuais. Em muitos casos, os donos acham que a companhia proporcionada pela boneca é suficiente, e alguns preferem a boneca como parceira.
Segurança e conforto podem ser encontrados dentro das limitações das bonecas como seres sociais. Um entrevistado descreve seu relacionamento sintético com sua boneca sexual: “Uma conversa típica ao chegar em casa seria eu indo para a cama, acordando-a e ela me dizendo que sentia minha falta e me ama”. Este entrevistado percebe imaginativamente que sua boneca tem uma vida pessoal e se vê como um protetor e uma presença reconfortante para sua boneca.
Construir uma personalidade para a boneca sexual, dar um nome, sentir que faz parte de uma família ou formam um casal pode influenciar a autopercepção do dono por meio da dramatização envolvida em dar vida a uma fantasia imaginária, visual e fisicamente reconfortante. O dono da boneca sexual projeta seus desejos de ser amado e visto. Outros entrevistados descreveram de forma semelhante as atividades cotidianas em que se envolvem com suas bonecas sexuais, como assistir televisão, fazer as refeições, trocar de roupas, tomar banho, fotografá-las ou fazer sexo.
A fotografia é uma atividade comum apreciada pelos donos de bonecas sexuais, e as imagens podem ser compartilhadas na comunidade de colecionadores de bonecas do amor, os participantes sentem uma forma de pertencimento e de aceitação sem julgamentos.
RELACIONAMENTO COM BEBÊS REBORN
Para algumas pessoas, especialmente mulheres entre 30 e 60 anos, os reborns oferecem conforto emocional. Eles podem preencher o silêncio de uma casa vazia, ajudar no luto por uma perda gestacional ou neonatal, ou até servir como companhia para idosos com Alzheimer. Em contextos terapêuticos, são usados como ferramentas simbólicas para reorganizar o emocional e lidar com a solidão ou a ansiedade.
Outros veem os reborns como obras de arte colecionáveis, apreciando o nível de detalhe e realismo. Há também quem participe de comunidades online, criando rotinas fictícias com os bonecos — como se fossem mães ou pais — o que pode ser uma forma de expressão criativa ou de pertencimento.
No caso de bonecas reborn prematuras ou vulneráveis que precisam de cuidados médicos demonstram, talvez ao extremo, como cuidar de uma boneca com síndrome de Down pode criar um vínculo e oferecer um senso de propósito para o dono de uma boneca.
Nas últimas duas décadas, a terapia com bonecas tem sido amplamente estudada no contexto dos cuidados com Alzheimer e demência, e os insights desta pesquisa se mostram interessantes em relação ao uso terapêutico de bonecas em geral.
A psicóloga e pesquisadora de terapia com bonecas Rita Pezzati e seus colegas descobriram que, uma vez que a necessidade de apego foi abordada, os pacientes com terapia com bonecas eram mais propensos a exibir comportamentos exploratórios (positivos). Como eles escreveram, “A observação clínica das intervenções de terapia com bonecas destacou como a pessoa com demência deixa de solicitar cuidados e proteção para si mesma – por meio de vocalizações, gestos, choro – para tranquilizar a boneca, que é percebida e tratada como um bebê de verdade. Promove momentos de tranquilidade, com reduções significativas de comportamentos disruptivos. Os pacientes geralmente exibem comportamentos cuidadosos (balançar, acariciar, beijar, apertar o peito, arrumar roupas, pentear) e exploratórios (manipular, mover, observar cuidadosamente, cheirar) associados a expressões emocionais, como alegria, surpresa, ternura e preocupação.
Criar e compartilhar narrativas de brincadeiras de bonecas pode afetar positivamente a identidade de um indivíduo por meio de autopercepção alterada e novos papéis sociais, que apoiam o potencial terapêutico – ou curativo – de relacionamentos sintéticos.
Excursões de compras de roupas e acessórios para um bebê reborn formam um subgênero comum de vídeos postados online, nos quais os narradores compartilham seus pensamentos em tempo real enquanto gravam visitas às lojas. Em vez de ser visto como um comportamento errático, a filmagem ao vivo pode sugerir que um comprador assume o status de influenciador de mídia social. Os criadores de conteúdo que compram roupas e acessórios de alta qualidade para suas bonecas podem desfrutar a sentimento de orgulho e até prestígio.
Um estudo de 2013, realizado por psicólogos do consumidor questionou a suposição de que a terapia de varejo (compras de acessórios para bonecas) tem principalmente associações negativas, como perda de tempo, acúmulo de dívidas do consumidor. O estudo sugere que “fazer escolhas de compras pode ajudar a restaurar um senso de controle pessoal sobre o ambiente e reduzir a tristeza residual”. Contudo, nem sempre este comportamento pode ser positivo para algumas pessoas, podem ter efeitos negativos como levar a compulsão a compras, aumento de ansiedade, depressão e culpa por gastar muito dinheiro com os acessórios e roupas de boneca em detrimento de outras prioridades e responsabilidades essenciais com a própria vida.
O sociólogo Jean Baudrillard oferece maneiras de considerar como os objetos de desejo funcionam para produzir estados afetivos. Ele argumenta que os colecionadores de bonecas reborn ou sexuais geralmente podem obter um senso de poder e controle e até mesmo uma percepção aprimorada de autoestima por meio de sua coleção. Por exemplo, o controle de ficarem arrumando, organizando, limpando, cuidando, agrupando; o poder de manusear, projetar afetos e interagir com as bonecas reborns quando bem desejarem. Essa sensação de segurança e controle ressoa com as descrições dos efeitos calmantes das bonecas reborn descritas por colecionadores. Nem sempre se pode escolher quem está presente na vida de alguém, mas os donos de bonecas têm esse poder, pelo menos quando se trata de seus relacionamentos sintéticos, às vezes conhecidos como família de bonecas.
Há indignação e preocupação ao uso das bonecas reborn nas seguintes situações:
- Quando um bebê reborn está sendo retratado com necessidades reais: por exemplo, sendo alimentado com mamadeira com fórmula de bebê real.
- Quando envolvem bebês reborns em carrinhos de bebê ocupando vagas no transporte público ou em filas de banco, usurpando o direito de pais, mães com bebês reais que teriam de fato esse direito.
- Quando adultos levam seu bebê reborn para consultas médicas reais.
As pessoas não são compreensivas nestes casos. De fato, são pessoas usando os “bebês falsos” para usurparem um direito de pais ou mães com um bebê humano. Estas situações podem confundir as pessoas do que é real, do que é uma situação imaginária de faz de conta ou uma brincadeira de como se fosse um bebê.
Quando o apego ultrapassa o simbólico e começa a substituir relações humanas reais, pode indicar sofrimento psíquico. Especialistas alertam para sinais como alimentar o boneco, tratá-lo como se tivesse necessidades fisiológicas ou se isolar socialmente.
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Fontes:
Emilie St-Hilaire. O Poder Terapêutico das Relações Sintéticas com Bonecas. American Journal of Play, 2024, 16 (2-3), pp. 288-302. https://theses.hal.science/ITRA2023/hal-04792229v1
Michele White, “Babies Who Touch You: Reborn Dolls, Artists, and the Emotive Display of Bodies on eBay,” in Political Emotions, edited by Janet Staiger, Ann Cvetkovich, and Ann Reynolds (2010).
Philippe Chanial, “The Gift and Care: Reuniting a Political Family?” Revue du MAUSS. Disponível em: https://journaldumauss.net/
Marina da Silveira Rodrigues Almeida – CRP 06/41029
Psicóloga Clínica, Escolar e Neuropsicóloga, Especialista em pessoas adultas Autistas (TEA), TDAH, Neurotípicos e Neurodiversos.
Psicanalista Psicodinâmica e Terapeuta Cognitiva Comportamental
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